Observar, escolher, clicar
Talvez o melhor investimento que eu fiz esse ano foi comprar um celular com câmera fotográfica. O telefone é acanhado, oferece alguns recursos que não impressionam. Ele tem um cartão de memória onde eu guardo alguns dos álbuns que ouço e as fotos que faço. Sua feição é simples. Minimalista. As teclinhas são pequenas, a tela colorida de um tamanho nem tão grande nem tão pequeno. Sua anatomia fininha faz com que ele caiba até nos meus bolsos mais apertados.
Sua funcionalidade é limitada. Mesmo não pegando em muitos lugares que eu costumo frequentar - na casa da Isa ele simplesmente morre -, o aparelho me mantém conectado durante o dia inteiro, inclusive nas madrugadas, período em que sempre recebo algumas ligações.
Pra falar a verdade, eu nunca fui muito amigo das tecnologias. Acho que existe um deslumbre desnecessário no qual a capacidade de análise e interpretação se perde na urgência por novos modelos e suas infinitas possibilidades. Aliás, pra mim existem apenas dois tipos de assuntos dos quais eu fujo igual o diabo da cruz: novidades tecnológicas e aqueles frequentes nas salas de academia, tipo "ganhei 2mm de bíceps, estou trabalhando o peitoral, eu quero uma barriguinha trincada...".
Feito este adendo tenho que admitir - mesmo assumindo uma certa incoerência - que este meu aparelhinho tem oferecido uma possibilidade que ultimamente está me viciando: a de registrar meu olhar sobre as situações cotidianas por meio de sua parca lente fotográfica. Estar com uma camerazinha, que, como eu já disse, cabe no mais apertado dos bolsos e que de tão comum é quase invisível, está me permitindo captar - com uma espontaneidade que compensa as deficiências técnicas - estes acontecimentos que antes passariam imperceptíveis.
Na minha página do orkut tenho publicado todo o material que eu coleto por aí. Neste exercício, mais importante do que os registros em si, é o fato de eu retornar a um olhar mais sensível sobre as coisas simples. Eu sempre vi muita beleza no cotidiano, naquelas típicas quartas-feiras citadas por Mário Quintana.
Há tempos eu tinha perdido o prazer em vivenciar situações corriqueirascomo o trajeto até o trabalho, um café com uma pessoa que você gosta durante uma pausa no expediente, um almoço comum, uma caminhada até a padaria, uma conversa sobre os resultados do futebol... Não dando atenção a estes pequenos e deliciosos prazeres - nos quais as coisas se mostram exatamente como são - estava me anulando um pouco, perdendo toda a graça da vida.
Eis que esse aparelhinho meia-sola me ajuda a despertar novamente para toda esta complexidade. Não sei se vou continuar fotografando, mas prometo aguçar minha sensibilidade para desfrutar toda a beleza destas quartas-feiras comuns.
4 Comments:
Grande, João.
Texto nota 10. Parabéns!
Eu também curto observar as coisas mais "simples" da vida. Aliás, vivo fujo de papo sobre tecnologia e academia. rs
Abs.
Sardinha
...Esta tecnologia facilitou muito...imagina que antes era meio complicado carregar uma câmera, mais um celular que era só telefone e um walk-man...engraçado falar destas coisas e logo você vai reler este post...e tamném vai achar engraçada e ultrapassada esta tecnologia...
Excelente publicação.
Que bom que tenha descoberto esse novo olhar.
Muito bom João Pedro!
Juntou a sua sensibilidade à tecnologia (não tão avançada como poderia ser) e nos deu um texto lindo!
Parabéns!
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